O jornal Público hoje faz uma recensão de um trabalho de Alfredo Marvão Pereira e Jorge Andraz sobre o financiamento das SCUT ("O impacto económico e orçamental do investimento em Scut"), num artigo de Pedro Ribeiro. O trabalho é publicado pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento, presidido pelo Eng. João Cravinho, ministro das Obras Públicas nos governos do Eng. Guterres.
As sete SCUT em Portugal - Beira Interior, Beiras Litoral e Alta, Grande Porto, Litoral Norte, Costa da Prata, Algarve e Interior Norte, numa rede de 921 quilómetros - trouxeram uma boa melhoria da rede viária nacional, com benefícios para as regiões envolvidas e para as restantes regiões (os
spillovers regionais).
Os autores concluem com um estudo econométrico que (1) o investimento nas SCUT é produtivo, gerando um acréscimo do PIB muito superior aos custos envolvidos e (2) o investimento paga-se a si mesmo, na medida em que os impostos induzidos são superiores aos encargos financeiros do Estado.
Mas há um detalhe menos amiguinho, segundo me pareceu. A saber: os encargos financeiros a arcar pelo Estado (7195 milhões de Euros) são basicamente o dobro do custo do investimento (3660 milhões de Euros), com valores a preços constantes de 1999. O que é que isto significa? Significa que a engenharia financeira contratualizada prejudica o Estado.
Admitamos o seguinte cenário - os encargos financeiros do Estado são amortizados durante 25 anos, com 5 anos de carência. Nesse caso o Estado tem uma responsabilidade anual de cerca de 360 milhões de Euros, a pagar de 2005 a 2024. Isto corresponde a uma TIR de 14% (admitindo uma taxa de inflação anual de 2%). É imenso! Se o financiamento das auto-estradas tivesse sido por dívida pública, a taxa de juro seria aproximadamente de 4%, o que daria um encargo anual de aproximadamente 183 milhões de Euros (valores ainda a preços constantes de 1999). "Segundo um estudo de 2005 do Tribunal de Contas, os encargos com as Scut serão este ano de 329 milhões de euros; em 2007 passarão para 589 milhões de euros" (citação do jornal).
Se todos os serviços publicos fossem financiados com a mesma lógica das SCUT, seria ncessário o dobro da despesa pública para financiar o Estado. Seria lindo!
Tentei encontrar o documento
on-line mas sem sucesso. Parece que o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento não tem
site na net.
Continuo a pensar que as ressalvas e as conclusões que redigi
aqui se mantêm válidas.
Uma nota final: sou muito desconfiado dos estudos econométricos. Lembro-me sempre de uma reflexão do econometrista Stephen Hall: se porventura fosse feito um estudo econométrico (descuidado) dos hospitais de Londres, o melhor hospital seria considerado dos piores. Porquê? Porque os casos mais difíceis e desesperados vão lá parar e portanto esse hospital tem índices de mortalidade superiores à média.